Não havia qualquer pista sobre como o homem foi parar ali. Ele não era de Gravataí. “A vítima perdeu a memória recente. Não recorda de nada”, acrescenta o delegado. A identificação veio dois dias depois. Era um morador de Sapiranga de 40 anos. “Passamos a reconstruir os fatos a partir de relatos de terceiros e apuramos que tinha sido arrebatado seis horas antes, em um galpão onde dormia, usado por usuários de drogas às margens da RS-239, em Sapiranga.”
O homem teria cometido um furto na cidade pouco depois da meia-noite. “Três vigilantes o encontraram por volta das 2 horas e o colocaram no carro da empresa de segurança. Disseram, a moradores da área, que o conduziriam para registro de ocorrência, só que nunca o levaram à delegacia.” E revela: “A gente descobriu um vídeo que mostra a vítima sendo levada pelos seguranças até o veículo.” A reportagem apurou que, entre a noite de 19 de outubro e manhã do dia seguinte, nenhum furto em Sapiranga foi comunicado à Brigada Militar e Polícia Civil.
Milesi conta que, além relatos de testemunhas e do vídeo, há contradições que incriminam os seguranças. “No primeiro depoimento, um deles alegou que nunca tinha participado de uma ação envolvendo aquela vítima. Afirmou que sequer a conhecia a vítima. Quando a gente apresentou o vídeo, ele fez outro depoimento com outra versão. Admitiu participação, mas alegou que deixaram a vítima na saída da cidade.” Para o delegado, uma história sem fundamento. “O poço fica a 30 quilômetros de distância. A vítima levaria de 6 a 8 horas para fazer o trajeto.”
O delegado frisa que os seguranças não foram atrás do suspeito para encontrar objetos furtados, mas para uma espécie de “prisão”. “Uma situação é tentar recuperar um bem subtraído. Outra é o objetivo de chegar à pessoa para castigar. E essa procura deve ser feita pela Polícia.” É apurado por que escolheram o manicômio abandonado em Gravataí para deixar a vítima.
Para Milesi, o caso está esclarecido como tentativa de homicídio. O inquérito deve ser concluído nesta quinta-feira com o indiciamento dos três. “A vítima estava bastante machucada, quase morrendo.” Se mantida a acusação na fase processual, os indiciados devem ir a júri e podem pegar pena de seis a 20 anos de prisão. A vítima se recuperou das lesões, voltou para Sapiranga e está em tratamento para deixar o vício em drogas.
O dono da empresa investigada diz que não tem relação com o crime. “Ninguém tem prova contra nós. Tenho prova que não fomos nós”, declara o vigilante de Sapiranga. Ele diz que conhece a vítima somente por um apelido. “Na minha empresa ninguém é Jesus para tirar a vida dos outros. Quem pode é só Deus. É uma acusação muto forte. As pessoas que largaram num poço têm que ser punidas.”